segunda-feira, 31 de março de 2014

9 maneiras de fechar um texto

Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Programa de Pós-Graduação em Educação
Argumentação, Estilo, Composição: Introdução à Escrita Acadêmica
Tomaz Tadeu da Silva

9 maneiras de fechar um texto

O parágrafo final, tal como o inicial, tem uma posição privilegiada na estrutura de um texto. É ele que dá a amarração final ao texto. Evidentemente, o tom e a forma do parágrafo final, assim como acontece com o parágrafo inicial, depende muito da natureza do texto. Assim, um texto puramente técnico, descritivo, não poderia terminar com algum tipo de apelo de ação, enquanto, por outro lado, tal tipo de apelo se ajustaria bem a um texto de caráter político, religioso ou moral. Em geral, entretanto, espera-se que o parágrafo final, de alguma forma, sintetize e resuma os temas principais do texto.

1. Interpelação direta ao leitor

Em geral, em textos dissertativos, utilizamos um modo de endereçamento ou interpelação impessoal e indireto (“deve-se”, “devemos”, “sabe-se”, “sabemos”, etc.). A adoção de um modo de interpelação direta (“ei, você aí!”), em geral repentina e inesperada, como nos exemplos abaixo, tem um efeito retórico bastante interessante.

Integre-se, pois, à corrente. Pluge-se. Ligue-se. A uma tomada. Ou a uma máquina. Ou a outro humano. Ou a um ciborgue. Torne-se um: devir-ciborgue. Eletrifique-se. O humano se dissolve como unidade. É só eletricidade. Tá ligado?
(Tomaz Tadeu da Silva, “Nós, ciborgues: o corpo elétrico e a dissolução do humano”, Antropologia do ciborgue. As vertigens do pós-humano. Belo Horizonte: Autêntica, 2000: 9-17. P. 16).

Hoje, o campo expressa não o desejo de afirmação do estereótipo envelhecido da bicha louca, mas o desejo de empreendermos todos, das mais diversas sexualidades e sensualidades, uma nova educação sentimental, não pela busca da autenticidade de sentimentos cultivados pelos românticos, mas pela via da teatralidade, quando, apesar da solidão, para além da dor maior da exclusão, da raiva e do ressentimento, possa ainda se falar em alegria, em felicidade. Faça uma pose. Eu faço. Agora.
(Denilson Lopes. “Terceiro manifesto camp”. O homem que amava rapazes e outros ensaios. Rio: Aeroplano, 2002: 89-120. P. 113)

2. Uma história, uma anedota

Questionado sobre sua História da sexualidade, Foucault respondeu, certa vez, que não pretendia escrever uma arqueologia das fantasias sexuais, mas sim uma arqueologia do discurso sobre a sexualidade e que esse discurso era “uma relação entre o que fazemos, o que estamos obrigados a fazer, o que nos está permitido fazer, o que nos está proibido fazer no campo da sexualidade; e o que está proibido, permitido, ou é obrigado a dizer sobre nosso comportamento sexual” (Foucault, 1996, p. 91). Acho que foi disso que procurei tratar aqui: das formas e das instâncias onde aprendemos esse discurso, de nossa apropriação e uso de uma linguagem da sexualidade que nos diz, aqui, agora, sobre o quer falar e sobre o que silenciar, o que mostrar e o que esconder, quem pode falar e quem deve ser silenciado. Procurei mostrar, também, que podemos (e devemos) duvidar dessas verdades e certezas sobre os corpos e a sexualidade, que vale a pena pôr em questão as formas como eles costumam ser pensados e as formas como identidades e práticas têm sido consagradas ou marginalizadas. Ao fazer a história ou as histórias dessa pedagogia talvez nos tornemos mais capazes de desarranjá-la, reinventá-la e torná-la plural.
(Guacira Lopes Louro. “Pedagogias da sexualidade”. In Guacira Lopes Louro. O corpo educado. Pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 1999: 9-34. Parágrafo final, p. 33)

3. Uma pergunta

Mas a questão da sexualidade permanecerá central para os debates sociais e morais? (...) O trono do “Rei Sexo” está começando a balançar? E, se isso está acontecendo, qual é o seu significado? Tudo que aprendemos sobre a história da sexualidade nos diz que a organização social da sexualidade nunca é fixa ou estável. Ela é modelada sob circunstâncias históricas complexas. Na medida em que entramos no período conhecido como “pós-modernidade”, é provável que vejamos uma nova e radical mudança nos modos como nos relacionamos com nossos corpos e com suas necessidades sexuais. O desafio será compreender, de uma forma mais efetiva do que no período da modernidade, os processos que estão em ação nesse campo.
(Jeffrey Weeks. “O corpo e a sexualidade”. In Guacira Lopes Louro. O corpo educado. Pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 1999: 35-82. Parágrafo final, p. 80)

Instituídos por este novo complexo científico-pedagógico, os Pareceres Descritivos exercem um novo poder de julgar, por colocar a criança em processo permanente de claridade, de produção, de normalização e patologização, até que ela mesma interiorize sua própria transparência e possa se tornar um civilizado indivíduo ocidental auto-normalizado. A suavidade de seu olhar, dita humanizante, está investida como técnica de poder, e é isto que o discurso educacional contemporâneo prossegue, reiteradamente, escamoteando. Até quando continuará olhando para esses olhos de poder sobre o currículo, de maneira inocente?
(Sandra Corazza. O que quer um currículo? Pesquisas pós-críticas em educação. Petrópolis: Vozes, 2001. Parágrafo final do capítulo 2, p. 55)

4. Apelo à mudança (pessoal, social, etc.)

Como sabemos, trata-se de uma maneira muito comum de concluir um texto na literatura educacional. Embora perfeitamente legítima, é possível pensar em outras maneiras de fechar um texto. Além disso, ainda que permanecendo no gênero da “prescrição”, pode-se pensar em formas de variá-lo.

Para que essas conversas se tornem até mesmo pensáveis em relação à educação é preciso que as educadoras e os educadores se tornem curiosos sobre suas próprias conceptualizações sobre o sexo, e ao fazê-lo, se tornem abertos também para as explorações e as curiosidades de outros relativamente à liberdade do “domínio imaginário”. (...) Quando pudermos estudar as histórias que o sexo provoca, as perversidades que ele pode imaginar e exercitar, então, provavelmente, nos envolveremos também no estudo de onde o conhecimento entra em colapso, torna-se ansioso, é construído outra vez. O currículo movimenta-se em direção ao polimorficamente perverso e à noção de erotismo de Bataille: o problema torna-se, então, o de formular questões que possam desestabilizar a docilidade da educação.
(Deborah Britzman. “Curiosidade, sexualidade e currículo”. In Guacira Lopes Louro. O corpo educado. Pedagogias da sexualidade. Belo Horizonte: Autêntica, 1999: 83-111. Parágrafo final, pp. 109-110)

5. Afirmação de uma convicção pessoal

Motivada pelos testemunhos e pelas reflexões de tantas estudiosas e estudiosos, acredito que o processo de construção dos estudos feministas e os seus desafios atuais são hoje, como foram antes, desafios epistemológicos. (...) Para responder a esses desafios parece necessário que mantenhamos vivas a capacidade de ousar e de transgredir, utilizando criativa e criticamente as teorizações feministas, bem como acolhendo o questionamento de outros campos de estudo. (...)
(Guacira Lopes Louro. Currículo, gênero e sexualidade. Porto: Porto Editora, 2000. Final do capítulo 1, p. 22-3)

6. Reiteração, paráfrase, retomada dos temas principais do texto

É a voz socialmente autorizada que inclui e exclui sujeitos e conhecimentos, determinando não apenas quais as identidades ou os saberes que podem integrar o currículo, mas também como essas identidades e saberes deverão aí ser representados. (...) No interior das instituições educacionais acontece uma parte importante desta disputa e, por isso, somos obrigatoriamente convocados/as. Afinal, qual é o nosso lado?
(Guacira Lopes Louro. Currículo, gênero e sexualidade. Porto: Porto Editora, 2000. Final do capítulo 3, p. 57)

7. Uma citação

É possível concordar com Stuart Hall (2000, p. 104) quando diz que a identidade é um desses conceitos que a perspectiva desconstrucionista colocou “sob rasura”; isto é, conforme explica, um conceito que talvez “não seja mais ‘bom para pensar’ - na sua forma original, não reconstruída”. Parece-me que no terreno da teorização educacional, o conceito de identidade cultural, tomado no seu caráter de multiplicidade, fluidez e instabilidade ainda pode ser útil. (...)
(Guacira Lopes Louro. Currículo, gênero e sexualidade. Porto. Porto Editora, 2000. Penúltimo parágrafo do capítulo 5, p. 107).

8. Seqüência de substantivos/orações substantivas ou adjetivos/oracões adjetivas

Dança-jogo-sonho antidialético e anti-religioso - leve, móvel, aéreo, ubíquo, inocente, gracioso, pueril, irreverente - de Dionísio-Criança, com seus brinquedos. De Dionísio-Constelação, com Ariadne no céu como estrela dançante. De Dionísio-Senhor-do-Eterno-Retomo, que reproduz o diverso no coração da síntese kantiana. Repete a diferença, pela vontade de poder reunida às forças postas em relação pelo acaso. Contraria a adiaforia. Nega o estado terminal e o de equilíbrio. E, acima de tudo isso, opõe-se a nosso caro, e tão custoso. Princípio de Identidade.
(Sandra Corazza. O que quer um currículo? Pesquisas pós-críticas em educação. Petrópolis: Vozes, 2001. Parágrafo final do capítulo 3, p. 76)

9. Orações infinitivas

Enfiar-se na leitura é en-fiar-se no texto, fazer com que o trabalho trabalhe, fazer com que o texto teça, tecer novos fios, emaranhar novamente os signos, produzir novas tramas, escrever de novo ou de novo: escrever. (Jorge Larrosa. Pedagogia profana. Danças, piruetas e mascaradas. Porto Alegre: Contrabando, 1998. Parágrafo final do Capítulo 6, p. 183)

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