sábado, 31 de maio de 2014

Educação em saúde: a individuação e a formação estética à vida

O Seminário Temático - Educação e Seus Intersessores teve hoje seu último dia de evento com a Defesa Pública da Tese de Doutorado “Educação em saúde: a individuação e a formação estética à vida” de Maria Auxiliadora Maciel de Moraes. Orientada pelo Prof. Dr. Silas Borges Monteiro.





"Professor Silas inicia a apresentação da tese de doutorado da professora Maria Auxiliadora Maciel de Moraes, como tema “Educação em saúde: a individuação e a formação estética à vida” , a qual associa Filosofia, Educação e Saúde. 
A professora questiona em seu trabalho "Como alguém se torna enfermeira?", de forma teórica, crítica e reflexiva. Traz ainda filósofos e produções de Nietzsche, como Ecce Homo e Zaratustra, relacionando- as com a Enfermagem como formação e profissão,bem como o conceito de saudê e doença. Discute inclusive sobre o currículo de formação do profissional enfermeiro."

quinta-feira, 29 de maio de 2014

Filosofia da diferença e educação

Em seu terceiro dia, o Seminário Temático - Educação e Seus Interesessores trouxe à cena no Auditório I do IE-UFMT, a Prof. Dra Sandra Mara Corazza (UFRGS) e Prof. Dr. Luciano Bedin da Costa (UFRGS), tendo como Moderadora a Mestranda Aline de Souza Campos.

"Dando continuidade ao evento “Educação e seus Intersessores”, contamos com a presença do Prof. Dr. Luciano Bedin da Costa e da Profa. Dra. Sandra Mara Corazza para compor a mesa Filosofia da Diferença e Educação. Corazza apresentou o conceito de professor tradutor, que põe em movimento uma Didática da tradução, ou uma Didática Artista. Ela vê a aula como feitura, como criação, o trabalho do professor como tradutor. Bedin propôs uma educação ornintorrincada, aquela que recolhe pedaços dispersos e os põe em relação elementos improváveis com intuito de fazer surgir o novo da vida onde parece existir apenas descaso, cansaço e morte. Assim, a educação seria lugar de encontros inesperados e criação do pensamento."



Educação permanente como potência de redes

No dia 28/5 a partir das 18:00 no Auditório I do CCBS III da UFMT, o Seminário Temático - Educação e seus Interesessores trouxe a Cuiabá o Prof. Dr. Ricardo Ceccim (UFRGS), tendo nesta noite como Moderador o Prof. Dr. Silas Borges Monteiro.

"Ceccim falou das mudanças governamentais que operaram a construção do ideal sobre valorização das diferenças na atenção à saúde coletiva. 
A educação permanente em saúde tem papel fundamental nesta evolução. As idéias e saberes devem ser compartilhados e um novo desenho da formação de profissionais de saúde possibilita a aproximação à comunidade e conhecimento das políticas de atenção à saúde coletiva. 
Aceitar a diversidade e a multiplicidade humana descobrindo que o modelo básico de “atendimento-prescrição” não deve encerrar o entendimento do que é melhor à saúde coletiva, mas que a singularidade deve permear o projeto terapêutico."




terça-feira, 27 de maio de 2014

Pensamento oblíquo: apor(é)tica do nome próprio

Hoje pela manhã, na Sala 68 do Instituto de Educação da UFMT, foi dada abertura ao Seminário Temático - Educação e Seus Intersessores. Nesse primeiro dia a fala foi do Prof. Dr. Silas Borges Monteiro.

"Na mesa Educação e Ética em Jacques Derrida o Prof. Dr. Silas Borges Monteiro colocou em cena conceitos e ideias inscritos na obra de Derrida como ética, estética, desconstrução e nome próprio em uma apresentação que se configurou como uma experimentação de elementos textuais, visuais e auditivos, trazidos em tela não como complementação ou ilustração ao argumento filosófico, mas como suplemento, como excesso. A ética como atravessamento da cultura, literatura música e design, não focalizada somente ao campo da filosofia, mas uma ética em meio à vida."





Segue o link do texto apresentado:

terça-feira, 20 de maio de 2014

Seminário Temático - Educação e seus intersessores

Cortes, viéses, transversalidades, transvalorações. O evento "Educação e seus intersessores", promovido pelo Grupo Estudos de Filosofia e Formação pretende proporcionar uma aproximação ao campo de saber da Educação e Saúde por seus atravessamentos que funcionam como potências de exorbitância. A Educação e a Saúde interserem com a Filosofia a fim de provocar extravasamentos a outros planos conceituais e práticos da vida, a fim de deixar rastros de diferença, geralmente apagados pelos interditos. Intersessores contra interditores.



Programação:

27 de Maio
Educação e a Ética em Jacques Derrida
8h às 12h | Local: Auditório 68 Instituto de Educação/ PPGE
Palestrante | Prof. Dr. Silas Borges Monteiro (UFMT)

28 de Maio
Educação permanente como potência de redes
18h às 22h | Local: Auditório CCBS III
Palestrante | Prof. Dr. Ricardo Ceccim (UFRGS)
Moderação | Prof. Dr. Silas Borges Monteiro (UFMT)

29 de Maio
Filosofia da diferença e educação
8h às 12h | Local: Auditório I do Instituto de Educação
Moderação | Aline de Souza Campos

30 de Maio
Defesa Pública da Tese de Doutorado “Educação em saúde: a individuação e a formação estética à vida”
14h às 18h | Local: Auditório 68 Instituto de Educação/ PPGE
Doutoranda: Maria Auxiliadora Maciel de Moraes (UFMT)
Orientador: Silas Borges Monteiro (UFMT)


Nota: O título do Seminário Temático Educação e seus intersessores é uma provocação. Nascido de um conceito de Gilles Deleuze e Felix Guattari, o termo intercessor foi (sub)vertido por intersecção, a fim de evitar a representação equivocada de que haverá, no debate, mediadores, ou intercessores. Optamos por um neologismo errôneo (talvez errático, por destinerrance), pois a visão do erro provocaria o mal-estar desejável de quem quer romper com as margens entre saberes. - Por Silas Borges Monteiro.

quinta-feira, 8 de maio de 2014

Friderich Nietzsche por: Sacarlett Marton

Scarlett Zerbetto Marton é professora de história da filosofia contemporânea na Universidade de São Paulo. É considerada uma das maiores conhecedoras brasileiras do filósofo alemão Friedrich Nietzsche. Sua tese de doutorado, Nietzsche - das forças cósmicas aos valores humanos, foi defendida em 1979 e publicada em 1980. Seu livro mais recente é A irrecusável busca de sentido, autobiografia intelectual em que colocou em questão suas opções filosóficas e pessoais, bem como criticou várias tendências da atual filosofia brasileira. Além disso fundou e coordena o GEN - Grupo de Estudos Nietzsche; é a editora-responsável dos "Cadernos Nietzsche" e da "Coleção Sendas e Veredas". Trabalha na área de Filosofia, com ênfase em História da Filosofia Moderna e Contemporânea, atuando principalmente nos seguintes temas: "Nietzsche, atualidade e crítica" e "Crítica da cultura contemporânea".

Sendo então um nome de peso, nesse curso livre de Humanidades, tendo como Módulo 1 a Filosofia, ela traz Nietzsche como, o filósofo da suspeita.


http://www.youtube.com/watch?v=NVMjJWekoIk

"Nietzsche é conhecido sobretudo por filosofar a golpes de martelo."

segunda-feira, 5 de maio de 2014

Parágrafos: estrutura e desenvolvimento

Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Programa de Pós-Graduação em Educação
Argumentação, Estilo, Composição: Introdução à Escrita Acadêmica
Tomaz Tadeu da Silva

Parágrafos: estrutura e desenvolvimento

I.                   Noções gerais sobre parágrafo

- Parágrafos devem começar e terminar com ideias/informações importantes.
- Em geral, a frase inicial de um parágrafo anuncia a ideia principal, aquilo do qual o parágrafo vai tratar.
- As frases do meio do parágrafo desenvolvem a ideia principal.
- A frase final deve sumariar, concluir, fechar a ideia introduzida no parágrafo, antecipando a ideia do seguinte.
- Um parágrafo deve fazer sentido como um todo; suas palavras e frases devem estar claramente conectadas.
- Cada parágrafo conecta-se com o anterior e com o seguinte.

     II.        Perguntas para verificar a estrutura e o desenvolvimento de um parágrafo

- Qual é a frase-tópico (na nomenclatura de Faraco e Tezza, “frase-guia”) de cada parágrafo? Ela é explícita ou implícita? Se explícita, em que lugar do parágrafo ela
está?
- Existe alguma frase que não esteja relacionada com a frase-tópico? E possível justificar sua inclusão?
- Cada parágrafo está organizado de forma a facilitar a leitura? De que maneira as frases estão ligadas? É preciso acrescentar conexões? Há conectivos que criam ligações inexistentes entre ideias? Há ideias que tem ligações, mas que não estão assinaladas por conectivos? Há conectivos que criam ligações inapropriadas?
- Cada parágrafo desenvolve a ideia-chave de forma completa? Que estratégias de desenvolvimento são utilizadas? Elas são eficazes? Que outras estratégias poderiam ser utilizadas? O parágrafo precisa ser mais desenvolvido?
- A primeira frase de cada parágrafo informa o leitor sobre o que o parágrafo irá tratar? A última frase conclui, sintetiza, fecha a discussão introduzida pela ideia principal?
- Há variação de tamanho entre os parágrafos? Há algum parágrafo demasiado longo ou demasiado curto? Há alguma ideia que poderia ser destacada por um parágrafo de uma única frase?
- De que forma os parágrafos estão ligados, conectados? E preciso acrescentar alguma conexão/conectivo?
- Há alguma expressão de transição que cria ligações não existentes entre parágrafos? Há ligações entre parágrafos que não estão assinaladas por expressões de transição? Há ligações inadequadamente assinaladas?
- De que forma o parágrafo introdutório captura a atenção do leitor? Como ele inicia? Com uma história, com uma pergunta, com uma afirmação forte? Poderia começar de uma outra maneira?
- De que forma o último parágrafo efetua a conclusão? Deixa no leitor uma última impressão que seja forte e marcante? Como termina? Com uma pergunta, uma citação, uma imagem marcante, uma advertência, um apelo à ação? De que outra forma poderia concluir?

      III.       Construindo parágrafos com unidade: foco em uma ideia principal

1.      Colocando a frase-tópico no início do parágrafo

- É a maneira mais comum de iniciar um parágrafo e de chamar a atenção para a ideia principal, dizer imediatamente ao leitor de que se trata. As frases subsequentes desenvolvem essa ideia principal:

Enquanto uns proclamam o fim da representação, entretanto, outros reivindicam o direito à representação. Os questionamentos lançados às epistemologias canônicas, às estéticas dominantes, aos códigos culturais oficiais partem precisamente de grupos sociais que não se vêem aí representados. Há uma revolta das identidades culturais e sociais subjugadas contra os regimes dominantes de representação. É essa revolta que caracteriza a chamada “política de identidade”.

2.      Colocando a frase-tópico no fim do parágrafo

- Em geral, a colocação da frase-tópico no início segue uma ordem lógica que vai do geral ao particular. A colocação da frase-tópico no final, ao contrário, vai do particular para o geral:

Homem, branco ou heterossexual: identidades que, por funcionarem como norma, não aparecem como tais. E o outro que é étnico. É o outro, como homossexual, que aparece como identidade inteira e exclusivamente definida pela sexualidade. A identidade feminina é marcada por falta em relação à do homem. A identidade subordinada é sempre um problema: um desvio da normalidade. Ela é, sempre, a identidade marcada. Como consequência, a pessoa que pertence a um grupo subordinado carrega, sempre, toda a carga e todo o peso da representação. Como identidade marcada, ela representa, sempre e inteiramente, aquela identidade. No regime dominante de representação, a identidade dominante é a norma invisível que regula todas as identidades.

3.      A fase-tópico inicial reiterada na frase final do parágrafo

- É possível combinar as duas coisas: uma frase-tópico que inicia o parágrafo e que é reiterada na frase final:

O fetiche deve sua existência à ambiguidade. É simultaneamente europeu e africano. Apresenta-se como visceralmente material, mas invoca, ao mesmo tempo, o que há de mais inapelavelmente transcendental. É matéria e é espírito. Humano e divino. Conceito e coisa. Autônomo e dependente. Tem um pé neste mundo e um olho no outro. O fetiche, num mesmo movimento, afirma e nega. Fascina e repugna. Reafirma a centralidade do sujeito europeu no mesmo gesto em que denuncia seu fascínio e curiosidade pelo outro colonizado. Autentica, por um momento, a autonomia do sujeito apenas para, no seguinte, pô-la em dúvida. O fetiche é presença e ausência. Aqui está ele; já se foi. Olha ali: ele parece ter vida própria; olha de novo: já não tem mais. Em sua metamorfose sexual, freudiana, movimenta-se constantemente entre o todo e a parte, o genuíno e o substituto, o mesmo e o diferente. Quando põe sua máscara social, marxiana, confunde coisa com gente e, inversamente, gente com coisa. O fetiche é um ser ambíguo, híbrido, limítrofe, fronteiriço.

4.      A ideia-chave está implícita

- A frase-tópico não aparece de forma explícita. Ela está implícita nas outras frases presentes no parágrafo:

A verdade como ficção, invenção e criação. Uma visão perspectivista e interpretativa do conhecimento. O conceito como produção e intervenção e não como descoberta ou reflexo. A insistência no caráter produtivo da linguagem. O privilegiamento da diferença e da multiplicidade em detrimento da identidade e da mesmidade. Rejeição da transcendentalidade e da originariedade do sujeito. O caráter heterogêneo, derivado, das formações de subjetividade. A não- identidade do “sujeito” consigo mesmo. A opção por uma genealogia em prejuízo de uma ontologia. A pesquisa não das essências e das substâncias mas das forças e das intensidades. Insistência no “poder” de inventar, fixar, tomar permanente e não na capacidade cognitiva de descobrir, revelar, desvelar. Contra o duvidoso gosto pela essência, uma declarada predileção pela aparência. Não a presença (do ser?), mas seu diferimento, sua diferença, seu retardamento, seu espaçamento. Horror ao pensamento da negação e da contradição. O devir em vez do ser. Não os valores mas sua valoração. Não a moral mas sua proveniência. [Qual é a ideia-chave?]

IV. Características de uma boa frase-tópico

 A frase-tópico não deve:

- ser vaga
- ser fraca
- ser geral
- ser óbvia
- esgotar-se em si mesma

A frase-tópico deve.

- ser instigante, instigadora
- ser problematizante
- ser intrigante
- ser forte
- permitir, exigir desdobramentos
- criar expectativas
- sugerir polêmica
- exigir demonstração, argumentação

Nos exemplos seguintes a versão “b” é melhor do que a versão “a”.

1. a) A linguagem descreve a realidade.
b) A linguagem não se limita a descrever a realidade.

2. a) O discurso instaura verdades.
b) Em contraste com a compreensão do senso comum de que o discurso se limita a descrever a realidade, alguns autores argumentam que o discurso faz muito mais do que isso: ele produz e cria uma realidade própria, ou seja, o discurso instaura verdades.

3. a) A escola transmite a ideologia dominante.
b) Mais do que transmitir o conhecimento propriamente dito, a escola transmite os valores e as ideias dominantes, ou seja, a escola transmite a ideologia dominante.

4. a) A filosofia da diferença teve origem na França, na década de cinquenta.
b) A filosofia da diferença, teve origem na França, na década de cinquenta, em resposta ao predomínio de filosofias como a fenomenologia, com sua ênfase na consciência e no sujeito.

5. a) O conceito de diferença é muito importante.
b) Por que se pode dizer que o conceito de diferença é importante?

V. Estratégias de desenvolvimento de parágrafos

Como regra geral, evitar parágrafos compostos de uma sequencia de frases vagas e genéricas. Procurar escrever frases que sejam específicas, precisas, “concretas”. Desenvolver plenamente uma ideia principal antes de passar para uma outra. A não ser que seja o objetivo explícito, não juntar num mesmo parágrafo uma série de ideias de mesmo nível de importância.

Mal:
O discurso cria verdades. A verdade é um efeito do poder. O saber é inseparável do poder. A verdade é produzida pelo poder.

Melhor:
Estamos acostumados com a ideia de que a linguagem simplesmente representa uma realidade que supostamente existiria fora e independentemente dela. Assim, por exemplo, quando pensamos na natureza da linguagem, tendemos a pensar em frases tais como “a maçã está sobre a mesa” que expressaria um fato extralinguístico ou extra-discursivo. É para nós mais estranha a ideia de que a linguagem não apenas representa alguma coisa, mas, mais do que isso, cria alguma coisa. Nessa última perspectiva, o discurso não se limitaria a descrever uma realidade que existiria fora e antes dele, mas, antes, produziria uma nova realidade, uma realidade que não existia antes. Assim, por exemplo, independentemente do fato de que seja efetivamente verdade que “João é pouco inteligente”, se essa frase for reiteradamente pronunciada acabará por criar como fato, na opinião das pessoas, de que “João é pouco inteligente”. Assim como acontece nesse caso relativamente simples, podemos dizer, de forma mais geral, que o discurso acaba por produzir verdades.

1.      Ilustrar, exemplificar

- Uma das formas mais comuns e eficazes de desenvolvimento de parágrafos consiste em ilustrar uma ideia através de um exemplo ou de uma série de exemplos.

É fácil compreender que identidade e diferença estão em uma relação de estreita dependência. A forma afirmativa como expressamos a identidade tende a esconder essa relação. Quando digo “sou brasileiro” parece que estou fazendo referência a uma identidade que se esgota em si mesma. “Sou brasileiro” - ponto. Entretanto, eu só preciso fazer essa afirmação porque existem outros seres humanos que não são brasileiros. Em um mundo imaginário totalmente homogêneo, no qual todas as pessoas partilhassem a mesma identidade, as afirmações de identidade não fariam sentido. De certa forma, é exatamente isso que ocorre com nossa identidade de “humanos”. E apenas em circunstâncias muito raras e especiais que precisamos afirmar que “somos humanos”.

2. Definir

- Trata-se de uma estratégia muito comum nos textos dissertativos ou argumentativos. Definir um conceito, neste caso, não significa simplesmente fornecer uma definição do tipo que é dada nos dicionários, mas precisá-la, fornecendo exemplos, distinguindo o conceito em questão de conceitos que lhe são próximos, contrastando-o com conceitos opostos, etc.

Nesse contexto, a representação é concebida como um sistema de significação, mas descartam-se os pressupostos realistas e miméticos associados com sua concepção filosófica clássica. Trata-se de uma representação pós-estruturalisla. Isto significa, primeiramente, que se rejeitam, sobretudo, quaisquer conotações mentalistas ou qualquer associação com uma suposta interioridade psicológica. No registro pós-estruturalista, a representação é concebida unicamente em sua dimensão de significante, isto é, como sistema de signos, como pura marca material. A representação expressa-se por meio de uma pintura, de uma fotografia, de um texto, de uma expressão oral. A representação não é, nessa concepção, nunca, representação mental ou interior. A representação é, aqui, sempre marca ou traço visível, exterior.

3. Dividir e classificar

- Dividir e classificar constituem, na verdade, uma única estratégia, vista de dois pontos de vista diferentes. Utilizamos a divisão se partimos de uma categoria mais ampla e a dividimos em duas ou mais subcategorias. Utilizamos a classificação se efetuamos a operação contrária: partimos de dois ou mais grupos mais restritos e os agrupamos numa categoria mais ampla. Assim, por exemplo, posso dizer que as pessoas que fazem dieta estão divididas entre aquelas que fazem dieta por questões de saúde e aquelas que fazem dieta por questões de estética (divisão). Inversamente, posso dizer que as pessoas que estão preocupadas com a estética e as pessoas que estão preocupadas com a saúde formam dois grupos que tendem a fazer dieta (classificação). No primeiro caso, parte-se das semelhanças para as diferenças e no segundo, das diferenças para as semelhanças.

A perspectiva critica de multiculturalismo está dividida, por sua vez, entre uma concepção pós-estruturalista e uma concepção que se poderia chamar de “materialista”. Para a concepção pós-estruturalista, a diferença é essencialmente um processo linguístico e discursivo. A diferença não pode ser concebida fora dos processos linguísticos de significação. A diferença não é uma característica natural: ela é discursivamente produzida. Além disso, a diferença é sempre uma relação, não se pode ser "diferente” de forma absoluta, é-se diferente relativamente a alguma outra coisa, considerada precisamente como "não- diferente”. Mas essa "outra coisa” não é nenhum referente absoluto, que exista fora do processo discursivo de significação: essa “outra coisa”, o “não- diferente”, também só faz sentido, só existe, na "relação de diferença” que a opõe ao "diferente”. Na medida em que é uma relação social, o processo de significação que produz a "diferença” se dá em conexão com relações de poder. São as relações de poder que fazem com que a "diferença” adquira um sinal, que o "diferente” seja avaliado negativamente relativamente ao “não-diferente”. Inversamente, se há sinal, se um dos termos da diferença é avaliado positivamente (o “não-diferente”) e o outro, negativamente (o "diferente”), é porque há poder. [A concepção 'materialista ” é discutida no parágrafo seguinte.]

Apesar de suas divergências - muitas, aliás - o pensamento de Gilles Deleuze e o pensamento de Jacques Derrida podem ser, ambos, caracterizados como a expressão de uma “filosofia da diferença”. A diferença é, em ambos, um conceito central: em Deleuze, por meio do desenvolvimento de uma “diferença em si mesma”; em Derrida, pela criação do conceito de diffèrance. Questionam, ambos, o privilégio que a metafísica concede à identidade em prejuízo da diferença: Deleuze ao colocar em questão o “pensamento da representação”; Derrida, ao problematizar a “metafísica da presença”.

4. Comparar e contrastar

- São duas estratégias bastante comuns e eficazes de desenvolvimento de parágrafos. Comparar coloca em evidência as semelhanças entre duas coisas (ver o exemplo imediatamente anterior, sobre Deleuze e Derrida). Contrastar, por sua vez, salienta as diferenças entre duas coisas. Há duas maneiras de fazer isso: 1. em bloco, apresentando todas as características de uma das coisas e, depois, todas as características da outra; 2. de forma alternada, focalizando, para cada característica ou conjunto de características, ora uma, ora outra das coisas.

A diferença de Deleuze não é exatamente a diferença de Derrida. Para Derrida, a diferença está estreitamente ligada à ideia linguística de significação. O desenvolvimento que ele faz da noção de diferença não pode ser separado de uma concepção do tempo como variável descontínua. Além disso, apesar de sua rejeição de uma estratégia puramente negativa, o seu conceito de diffèrance ainda permanece, de alguma forma, subordinado a uma certa ideia de negação. Em Deleuze, por outro lado, o conceito de diferença está ancorado mais na noção de expressão do que na de significação. Em contraste com Derrida, a noção de tempo subjacente à sua concepção da diferença, é fundamentalmente, inspirado em Bergson, de um tempo contínuo. Finalmente, seu projeto do desenvolvimento de uma “diferença em si mesmo” rejeita terminantemente qualquer apelo ao mínimo traço de negatividade. [Em bloco ]
A diferença de Deleuze não é exatamente a diferença de Derrida. Enquanto que, para Derrida, a diferença está associada à ideia de significação, para Deleuze, é a noção de expressão que é central. Se para Derrida, a noção de tempo que serve para o desenvolvimento do conceito de diffèrance é fundamentalmente a de um tempo descontínuo, para Deleuze, em contraste, inspirando-se em Bergson, é a continuidade do tempo que é fundamental. Finalmente, apesar de seus esforços para se desligar da negatividade da dialética, enquanto Derrida continua preso a uma certa forma de negação. Deleuze rejeita terminantemente qualquer apelo a uma estratégia negativa dc pensamento, [Alternância]

5.      Articular relações de causa (razão, motivo) ou efeito (consequência)

- É difícil pensar num texto dissertativo ou argumentativo que não explore relações de causa (razão, motivo) ou efeito (consequência).'Evidentemente, há muitas maneiras de apresentar processos de causa ou efeito, algumas mais explícitas, nas quais são visíveis marcas linguísticas que assinalam esse tipo de relação (consequentemente, logo, então, pois, assim, portanto, etc.), outras mais implícitas, nas quais a relação está apenas sugerida. Na verdade, grande parte de um texto dissertativo é feito de parágrafos cujo desenvolvimento consiste em justificar (dar as razões) a afirmação contida na frase-tópico. “Por que podemos afirmar isso?” Quer dizer, explicar (dar as razões de uma afirmação) é uma das estratégias básicas de desenvolvimento de parágrafos num texto dissertativo.

Não se pode esquecer que a hibridização se dá entre identidades situadas assimetricamente em relação ao poder. [POR OUÊ?] Os processos de hibridização analisados pela teoria cultural contemporânea nascem de relações conflituosas entre diferentes grupos nacionais, raciais ou étnicos. Eles estão ligados a histórias de ocupação, colonização e destruição. Trata-se, na maioria dos casos, de uma hibridização forçada.

6. Reiterar, parafrasear, retomar

- Outra vez, na medida em que o objetivo de boa parte dos parágrafos dos textos dissertativos concentra-se em explicar ideias, eles são necessariamente compostos de explicações, as quais, por sua vez, como todo bom professor sabe, consistem em expressar de uma outra forma a mesma ideia: reiterar, parafrasear, retomar.

Primeiramente, a identidade não é uma essência; não é um dado ou um fato - seja da natureza, seja da cultura. A identidade não é fixa, estável, coerente, unificada, permanente. A identidade tampouco é homogênea, definitiva, acabada, idêntica, transcendental. Por outro lado, podemos dizer que a identidade é uma construção, um efeito, um processo de produção, uma relação, um ato performativo.

7. Combinar diversas dessas estratégias

- Normalmente, a composição de um parágrafo é feita por uma combinação de algumas dessas estratégias. Pode-se, por exemplo, dar as razões de uma afirmação, ao mesmo tempo que se ilustra a afirmação com exemplos. O importante a reter é que a construção de um parágrafo se dá por acumulação, progressão, desenvolvimento. Não é por acaso que todas essas palavras (desenvolver, desenrolar, desdobrar, explicar) estão etimologicamente relacionadas. Desenvolver é des+envolver e envolver é enrolar. Assim, desenvolver é desenrolar. Desdobrar, por sua vez, é des+dobrar. Finalmente, explicar é ex+plicar e plicar vem de um verbo latino que significa dobrar. Logo, desenvolver = desdobrar = desenrolar = explicar. (Poderíamos acrescentar a esses verbos os verbos “envelopar” e “desenvelopar” que, vindos do francês, correspondem aos nossos “envolver” e “desenvolver”). Pode-se pensar na ideia-chave que está contida na frase-tópico como uma ideia concentrada, dobrada, envolvida, “plicada”, que contém em si outras ideias que precisam ser desdobradas, desenvolvidas, explicadas. Inversamente, podemos pensar nas frases que se desenvolvem a partir da frase-tópico como expressando ideias que, se dobradas, envolvidas, enroladas, “plicadas”, retornarão a seu estado “original”, compactado.

- Para finalizar, as duas regras fundamentais na estratégia de desenvolvimento de parágrafos:

1.      NÃO pular de ideia para ideia no interior de um parágrafo, sem qualquer transição. Cada uma das ideias deve estar relacionada com uma MESMA ideia principal.

2.      Não ficar, entretanto, simplesmente REPETINDO a MESMA ideia, sem acrescentar nenhuma informação nova. O parágrafo é ACUMULAÇÃO, PROGRESSÃO, DESENVOLVIMENTO.


Em suma, não saltar, mas também não ficar no mesmo lugar.

quinta-feira, 1 de maio de 2014

Como argumentar

Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Programa de Pós-Graduação em Educação
Argumentação, Estilo, Composição: Introdução à Escrita Acadêmica
Tomaz Tadeu da Silva

Como argumentar

Comecemos pelo óbvio: o objetivo central de um texto acadêmico é o de argumentar a favor de alguma tese específica. Esquematicamente, um texto acadêmico consiste nisso, na apresentação de uma tese e na sua demonstração. Como consequência, esse tipo de texto lida basicamente não com aquilo que é incontestavelmente verdadeiro (não precisa ser demonstrado, porque é universalmente aceito), nem com aquilo que pertence à esfera da pura preferência pessoal (tampouco precisa ser demonstrado, porque é, por definição, “verdadeiro” apenas para mim), mas com aquilo que é apenas verossímil, isto é, com aquilo que pode ser verdadeiro ou não. É tão somente o verossímil, o discutível, que precisa de demonstração. Argumentar consiste em mostrar que o verossímil é também verdadeiro.

Como fazer essa demonstração? Ao desenvolver um argumento em torno de alguma tese, utilizo recursos de natureza variada, a lógica, a dedução e o raciocínio; a apresentação de fatos, exemplos e estatísticas; a citação de fontes autorizadas. Trata- se de recursos próprios do discurso acadêmico de caráter puramente científico. Numa esfera intermediária, em que se situam alguns dos nossos textos de teoria educacional, talvez de natureza mais política ou ética, pode-se utilizar argumentos que apelem para objetivos ou valores partilhados por um determinado grupo cultural, político, nacional, sexual, racial, etc. Num outro extremo, já fora do âmbito acadêmico, utilizam-se recursos de ordem emocional e afetiva, próprios de discursos como o político, o jurídico, o publicitário, etc. Por definição, em um texto acadêmico utilizam-se apenas métodos que podem ser considerados lógicos e racionais, que fazem apelo apenas à razão e ao raciocínio e não à emoção e ao sentimento.

Há basicamente dois modos de raciocínio que levam a uma tese ou a uma conclusão: a indução (ou generalização) e a dedução (ou particularização). O primeiro é de ordem experimental, empírica; o segundo, de ordem lógica. Uma argumentação complexa é feita de uma combinação dos dois. A indução consiste em se estabelecer a verdade de uma conclusão ou principio geral ou universal a partir da verificação da verdade de um número “suficiente” ou “razoável” de casos particulares. Assim, por exemplo, no seu texto sobre uma esquina de Porto Alegre, Rosana, tendo verificado que um número considerável de pessoas portavam seus apetrechos para chimarrão, chegou à conclusão ou generalização de que os gaúchos tendem a carregar esse tipo de equipamento. A dedução, por outro lado, consiste em se chegar a uma conclusão simplesmente aplicando-se uma regra geral a um caso particular. O raciocínio básico é o de que se um princípio ou característica é verdadeiro ou válido para o universo, será verdadeiro ou válido para qualquer elemento desse universo. Trata-se de uma questão de pura lógica. Não há aqui nenhuma exigência de verificação empírica. Evidentemente, numa argumentação complexa supõe-se que o princípio cuja universalidade é suposta tenha sido verificado por indução, isto é, empiricamente ou experimentalmente, mas no contexto isolado da dedução, a validade do princípio universal (ou premissa maior, na fórmula do silogismo clássico) não está em questão. O que importa é que o raciocínio seja formalmente ou logicamente válido. Para utilizar o mesmo exemplo da Rosana, poderíamos concluir que Rodrigo, um gaúcho, deve andar com seu equipamento de chimarrão porque todo gaúcho faz isso. Se quisermos colocar na forma do silogismo clássico teríamos:

Todo gaúcho porta seu equipamento de chimarrão. (premissa maior)
Rodrigo é gaúcho, (premissa menor)
Logo, Rodrigo porta seu equipamento de chimarrão. (conclusão, tese)

Não está em questão, aqui, a validade da premissa maior ou do princípio universal (que vale para todo elemento do universo), mas a validade interna ou formal do raciocínio. Para ser válido, a premissa maior deve ser uma proposição de alcance universal que supõe que todos os elementos de um determinado universo partilhem alguma propriedade, a premissa menor deve ser uma proposição que reconhece um elemento qualquer como pertencendo àquele universo e a conclusão deve atribuir, como consequência, a mesma propriedade partilhada por todos os elementos do universo a esse elemento particular. Se representarmos por A a característica que define o universo (gaúcho, neste caso), por B o indivíduo que reconhecemos como pertencendo ao universo (Rodrigo, no nosso exemplo) e por C a propriedade partilhada por todos os membros do universo (portadores de equipamento de chimarrão, no nosso exemplo), teríamos, esquematicamente:
           
A-C
B-A
B-C

Para ser válido, um silogismo deve, pois, ter necessariamente essa forma.
Ao apresentar os modos de argumentação desse modo formal, ficamos com a impressão de que eles têm uma utilização puramente acadêmica ou teórica. Sob formas talvez irreconhecíveis, eles são, entretanto, parte integrante dos raciocínios e dos pensamentos que fazemos em todas as atividades de nossa vida cotidiana. É possível, por exemplo, descrever cada uma das decisões que tomamos em nosso cotidiano como o resultado final de uma complexa cadeia de raciocínio constituída por uma combinação de indução e dedução. Como exercício, considere, por exemplo, a seguinte decisão: “vou me candidatar à seleção ao Doutorado em Educação da UFRGS”. Tomando essa decisão como sendo a conclusão final, construa a possível cadeia de raciocínio que levou a essa decisão.

Temos dificuldade em reconhecer os dois modos básicos de argumentação e demonstração (dedução e indução) tanto na vida cotidiana quanto em nossos textos pela simples razão de que eles aí aparecem sob as mais variadas formas. As formas linguísticas que temos para expressá-los são infinitamente mais variadas do que nos sugere a descrição que deles se fazem nos manuais de lógica e nos livros que lidam com a questão da argumentação. Para ilustrar isso, podemos voltar ao exemplo dos gaúchos e do chimarrão. A conclusão da Rosana, “Rodrigo deve andar com seu equipamento de chimarrão porque é gaúcho” não lembra imediatamente a forma do silogismo clássico porque não está claramente dividida em premissa maior - premissa menor - conclusão. A língua é muito mais sutil e muito mais complexa do que sugerem os manuais de lógica. O “raciocínio” pode ser ainda muito mais sintético e conciso, como na clássica exclamação machista dirigida a uma mulher na direção de um carro: “Barbeira!”. (Refaça o silogismo que leva a essa “conclusão”).

Observe que o silogismo é válido; o que é duvidoso é o processo indutivo - uma generalização indevida – (que levou à premissa maior e é aqui que reside o machismo e o preconceito). Grande parte da eficácia desse tipo de “raciocínio” provém do fato de que há certo “acordo” geral relativamente aos seus pressupostos. Na retórica clássica, um raciocínio dedutivo em que a premissa maior está implícita e é supostamente partilhada chama-se “entimema”. O estereótipo baseia-se, em grande parte, na eficácia desse mecanismo. (Uma boa maneira de questionar um estereótipo consiste justamente em tornar explícita a premissa maior).

Falácias e problemas de argumentação

As falhas de argumentação e as falácias devem-se, fundamentalmente, à deduções inválidas ou a generalizações indevidas, mas também a apelos a recursos extra-racionais (emocionais, subjetivos, pessoais, etc.). Destacaremos os seguintes problemas:

l. Generalizações indevidas - fazemos uma generalização indevida quando induzimos um princípio geral ou universal a partir de um número insuficiente de casos particulares. Evidentemente, o que se pode considerar “número insuficiente” depende de cada contexto específico, mas como regra geral deve-se desconfiar de toda generalização (olha aí, uma delas!). O primeiro gesto face a uma generalização deve ser o de desconfiança; apenas num segundo momento, depois de suficiente reflexão e consideração, é que talvez possamos ir adiante com a generalização. É preciso observar que a área semântica da generalização é bastante vasta. A generalização se esconde sob uma gama bastante ampla de expressões linguísticas que inclui não apenas suas manifestações positivas (todo, etc ), mas também as negativas (nenhum, etc.). Eis aqui uma lista parcial dessas expressões: todo, sempre, nunca, tudo, jamais, nenhum, cada, cada vez, geralmente... (completem!). Lembrem- se também de que a generalização não se expressa apenas por meio de formas gramaticais como as que acabei de listar, ela se disfarça sob muitas outras formas. Assim, por exemplo, na área mais propriamente “moral” ou “ética” expressões do tipo “E preciso”....”, “Devemos...”, muito comum nos parágrafos finais de certos textos educacionais, também podem ser consideradas generalizações (no caso, pretendemos estender para todo mundo certos princípios éticos, morais ou políticos que nós, particularmente, consideramos válidos). Também podem ser colocadas na classe das generalizações, certas expressões linguísticas de atribuição de autoria que levam a supor que uma afirmação particular é partilhada universalmente. Assim, por exemplo, quando se escreve, num texto, algo como “Pensa-se que os brasileiros são generosos...”, a impessoalidade do pronome reflexivo “se” sugere que esse pensamento seja universalmente partilhado quando pode não ser o caso (geralmente, não é). Algo similar se passa com o emprego do pronome “nós” quando se atribui à ação a que ele se refere uma universalidade que pode não ter (“Nós acreditamos que...”, na suposição de que o “nós” esteja representando um grupo mais amplo do que aquele que é legítimo supor). Nesses casos, é bom aplicar a famosa frase popular, “nós quem, cara pálida?”. Tudo isso não significa dizer que não se deve jamais generalizar. Trata-se apenas de uma questão de prudência e cuidado. Às vezes, pode-se “salvar” uma generalização aplicando-se uma expressão atenuante ou limitante. Em vez de simplesmente dizer “em todos os casos”, por exemplo, pode-se afirmar, de forma mais modesta, “em muitos casos”, “nos casos conhecidos”, “nos casos examinados”, etc. E existem casos, evidentemente, em que a generalização é justificável.

Muitos dos argumentos que ouvimos sobre questões públicas e políticas baseiam-se em generalizações indevidas ou apressadas. Assim, por exemplo, quando se argumenta que “se proibíssemos filmes violentos na televisão, haveria menos violência juvenil”, está-se utilizando um argumento com base numa generalização indevida. Neste caso, não se trata apenas de que a generalização se baseia num número insuficiente de casos, mas, de forma muito mais importante, trata-se de uma generalização que talvez jamais poderá ser feita, considerando-se a complexidade dos fatores que causam a violência juvenil. Trata-se de uma simplificação.

2. Argumentos do tipo non sequiur - incorremos nesta falha de raciocínio quando deduzimos de uma dada premissa uma conclusão com a qual ela não tem qualquer conexão. Essa falácia é evidente quando nós utilizamos alguma partícula de ligação entre a premissa e a conclusão, como neste exemplo: “É evidente que o discurso constitui a subjetividade, pois todo discurso é um componente essencial de relações de poder”. (Qual é a premissa? Qual é a conclusão?). Ela é menos evidente quando a ligação está apenas implícita: “O discurso é um componente essencial das relações de poder. Ele é um elemento importante na constituição da subjetividade”. De uma maneira ou de outra, é importante examinar o que escrevemos para flagrar as passagens em que estabelecemos relações entre proposições cujas conexões não estão demonstradas.

 3.  Argumentos circulares - caímos nesse tipo de falácia quando utilizamos para provar ama proposição uma outra proposição que não é nada mais do que a mesma proposição inicial sob outra forma. Exemplo: “E evidente que o discurso constitui a subjetividade, pois a subjetividade é um produto do discurso”. Assim colocada, parece evidentemente ridícula, mas trata-se de uma falácia que é encontrada muito mais frequentemente do que se pensa.

Marcadores linguísticos da argumentação

A tabela seguinte lista alguns dos principais marcadores linguísticos de uma sequencia argumentativa:



Exercícios

1.      Considere o seguinte trecho da “Meditação Segunda” das Meditações de Descartes (Obra escolhida, Bertrand Brasil, p. 125):

O que poderá (...) ser considerado verdadeiro? Talvez nenhuma outra coisa a não ser que nada há no mundo de certo. (...) Eu me persuadi, pois, de que nada havia no mundo, que não havia nenhum céu, nenhuma terra, espírito algum, nem corpo algum. Persuadi-me também, portanto, de que eu não existia? Certamente não: eu existia sem dúvida, já que eu me persuadi ou apenas pensei alguma coisa. Mas suponhamos que haja algum enganador, não sei qual, muito poderoso e muito ardiloso que empregar (toda a sua indústria em engancir-me sempre). Não há, pois, dúvida alguma de que sou, se ele me engana; e, por mais que me engane, não poderá jamais fazer com que eu nada seja, enquanto eu pensar alguma coisa. De sorte que, após ter pensado bastante nisso e de ter examinado cuidadosamente todas as coisa, cumpre enfim concluir e ter por constante que esta proposição, eu sou, eu existo, é necessariamente verdadeira, todas as vezes que a enuncio ou que a concebo em meu espírito.
(Com pequenas modificações, com o devido perdão de Descartes)
           
Neste trecho. Descartes chega duas vezes à conclusão “eu existo”. Refaça o raciocínio de Descartes, destacando, em cada caso, as premissas e as conclusões.

2.      Considere o seguinte trecho de Vigiar e punir, de Foucault.

A prisão não deve ser vista como uma instituição inerte, que volta e meia teria sido sacudida por movimentos de reforma. A “teoria da prisão” foi seu modo de usar constante, mais que sua crítica incidente - uma de suas condições de funcionamento. A prisão fez sempre parte de um campo ativo onde abundarem os projetos, os remanejamentos, as experiências, os discursos teóricos, os testemunhos, os inquéritos. Em torno da instituição carcerária, toda uma prolixidade, todo um zelo. (Vozes, 22a ed., p. 198).

Qual é a conclusão do raciocínio desenvolvido neste parágrafo? Quais as premissas que levam a essa conclusão?

3.      Considere o capítulo 1 do livro Identidade e diferença. Leia os parágrafos iniciais (até p. 9, terminando na frase “A identidade é, assim, marcada pela diferença”). A autora desenvolve todo um raciocínio, para desenvolver uma tese, para chegar a uma conclusão. Qual é a tese? Que método ela utiliza para desenvolver essa tese? Agora, partindo da mesma tese, desenvolva-a por meio de um outro método.

4.      Considere o segundo parágrafo da p. 17 do mesmo texto. Qual é o argumento principal deste parágrafo? Qual a estratégia principal da autora para desenvolver essa conclusão?
    
    5.       A frase “O outro cultural é sempre um problema, pois coloca permanentemente em xeque nossa própria identidade” (Identidade e diferença, p. 97) pode ser considerada um “entimema”. Isto é, a premissa maior ou o pressuposto está implícito, na suposição de que ele é aceito, de forma partilhada, pelo autor e pelo leitor. Reconstrua a frase em termos do silogismo clássico, destacando a premissa maior implícita.