sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

O movimento como escritura em um currículo-dançarino¹

Larissa Silva Freire Spinelli

Pesquisadora participante do Núcleo UFMT do
Projeto Escrileituras: um modo de "ler-escrever" em meio a vida

O leitmotiv Para dançar de olhos fechados /Para dançar de olhos abertos/, inspirado na atividade criadora da coreógrafa alemã Pina Baush, diz da arte e da educação enquanto “movimento” no sentido de reduzir a separação entre o conhecimento cotidiano, o conhecimento da cultura de massa e o conhecimento escolar. Nesta animação, o cultural se torna pedagógico e a pedagogia se torna cultural.

Tanto as instituições e instâncias culturais diversas são pedagógicas como também a pedagogia é uma forma cultural, ambas enquanto sistemas de significação implicados na produção de significados a favor da diferença.

O currículo e a pedagogia das formas culturais extraescolares são dançarinos, coreografam o movimento, escutam, observam e são capazes de olhar de olhos fechados. Um currículo assim, incitado por Corraza & Tadeu (2003), que com sua potência de afectar e ser afectado desenrola os seus segmentos móveis e figuras moventes numa exterioridade pura. E dispersando-os, mesmo que seus fluxos sejam canalizados, ele se precipita e volta a jorrar, transborda, vaza, escorre para se tornar vetor de transformação.
Desta vez, o desafio é arriscar a desestruturar a significação e aprender a ler uma linguagem, ampliar o vocabulário, encontrar um modo de se expressar, ensaiar um novo movimento de dança!

Como diz Jacques Derrida (2011, p. 40) ao lembrar que Nietzsche nos recomendou uma dança da pena: “Saber dançar com os pés, com as ideias, com as palavras: será preciso dizer que é também necessário sabê-lo com a pena – que é preciso aprender a escrever”?



Referências
CORAZZA, Sandra Mara; SILVA, Tomaz Tadeu. Composições. Belo Horizonte: Autêntica, 2003.

DERRIDA, Jacques. A escritura e a diferença. (Trad. Maria Beatriz Marquez Nizza da Silva, Pedro Leite Lopes e Pérola de Carvalho). São Paulo:Perspectiva, 2011.

sexta-feira, 14 de dezembro de 2012

Alguma coisa do exorbitante

Ângela Fontana Velho
Bolsista de mestrado do Núcleo UFMT do
Projeto Escrileituras: um modo de "ler-escrever" em meio a vida

Ex-orbitante.
Fora da órbita.
O que excede os limites.
Além do justo e do razoável.
Copioso. Alcandorado. Grandíloquo. Louco.
Além dele, o inesgotável. É um vampirismo dos sentidos, que me esgota e ao mesmo tempo me excede, me satisfaz perdidamente. É a tempestade que termina e é a escuridão que sobrevem depois dela. É escassez de água e de luz e, ao mesmo tempo e sobretudo, uma consciência da existência. É olhar tanto e tão fixamente para o abismo que ele me invade. É uma história silenciosa e louca, uma angústia prazerosa e interminável que dura alguns poucos segundos. Um movimento lento de câmera que, na direção de um inevitável fim, nunca se aproxima. É um orgasmo iminente. Nunca arrebatador porque não cessa. Vazio irônico, porque cheio e complexo. A sutileza de um fim que nunca termina. Rudimentar e denso. É um jogo, uma escritura, uma impossibilidade, um labirinto de inscrições.
Depois dele e através dele nada sobra, a não ser uma espécie de... Nada. Ou não.
Que o exorbitante cumpra o seu papel. Provoque. Corte o olho.

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Genealogia effiana

Silas Borges Monteiro 
Professor Associado da UFMT
Coordenador do EFF e do Núcleo UFMT do
Projeto Escrileituras: um modo de "ler-escrever" em meio a vida

Não saberia dizer o que é preciso ser feito para que um grupo de pesquisa ganhe corpo. Tenho a tendência de achar que seus elementos constituintes criam força pelo acaso. Algo, certamente, é fundamental: as pessoas que dele participam. E, talvez aí, resida o grande elemento casual: como trazer para ele as pessoas que, como o coordenador, desejem que um grupo de pesquisa ganhe a feição adequada de um grupo de pesquisa. Diferente de uma empresa, um grupo, embora haja seleção das pessoas que dele participam, não contrata seus membros. Seus participantes movimentam-se em direção a ele pelas razões mais diversas.

Não sei como se faz um grupo de pesquisa. Imaginava que resultava de um movimento de pessoas, quase espontâneo, em torno de um tema. Mas não me parece assim. Se não consigo dizer como se faz um grupo, posso, ao menos, contar como se fez o que eu lidero.

Do ponto de vista formal, um grupo de pesquisa no Brasil ganha alcance e legitimidade quando registrado no Diretório de Grupos do CNPq. Não sei hoje, mas em 2004, bastava, com seus dados pessoais, criar o registro, como se faz com uma página nas redes sociais, com a diferença que, depois de criada, deveríamos avisar a Pró-reitoria de Pesquisa da Universidade e aguardar que ela autenticasse o registro. Simples assim.

Entendi que começariam a fazer parte dele estudantes de graduação e pós-graduação que estivessem sob minha orientação. Assim tem sido, mais ou menos. Vez por outra, pessoas se aproximam das atividades do grupo. Geralmente, do mesmo modo que vêm, vão.

O primeiro nome do Grupo foi GEDFFE: Grupo de Estudos e Pesquisas em Didática, Filosofia e Formação de Educadores. Didática e Formação de Educadores nasciam de meu doutorado; Filosofia de minha formação inicial. Desde 2012 é EFF: Estudos de Filosofia e Formação. Acho que tem mais a feição atual.

O primeiro projeto de relevância do Grupo foi financiado pelo FNDE intitulado Acompanhamento e avaliação do processo de implantação do Plano de Desenvolvimento da Educação no Estado de Mato Grosso, de 2007 a 2011. O segundo, aprovado no ano seguinte e concluído em 2010 foi Quando profissionais tornam-se professores, financiado pelo CNPq. O terceiro projeto foi o PROCAD (financiado pela CAPES), em duas versões, desenvolvido de 2009 a 2013, contando com a parceria da USP sob a coordenação da professora Selma Garrido Pimenta, minha orientadora de doutorado. Atualmente está em desenvolvimento, iniciado em 2011 com conclusão prevista para 2014, Escrileituras: um modo de ler-escrever em meio à vida, financiado pela CAPES no edital Observatório da Educação CAPES/INEP. Outros projetos foram feitos ao longo deste tempo, mas com feições mais pontuais, de um ano, deixando poucas marcas no grupo. Houve um momento importante no GEDFFE: a organização do Seminário Educação do Instituto de Educação da UFMT, no ano de 2007. Deu fôlego e motivação ao Grupo. Nosso pequeno grupo, com muita ajuda, claro, organizou o evento, trazendo de volta os Anais impressos do Seminário, algo descontinuado nos anos anteriores. Foi bonito, elegante, chamou muito atenção. O sucesso do evento deveu-se muito ao trabalho da Cláudia Moreira e Renata Cabrera. Esse movimento trouxe muita gente ao redor do grupo. Mas, como vieram, foram. Embora tenha sido grande o vigor do momento, esgotou-se em 2010. Era preciso morrer o GEDFFE para nascer o EFF, movido pelo Observatório da Educação com o projeto Escrileituras, em parceria com UFRGS, UFPel e UNIOESTE, sob a coordenação da professora Sandra Mara Corazza.

O EFF tem, basicamente, três interesses: a educação, a filosofia e a saúde. Vejo nexos profundos entre estes interesses. Eles criam um ambiente produtivo mobilizado por uma das principais indagações que movem as pesquisas que eu oriento: como tornar-se o que se é. Essa questão nascida do título de um dos últimos livros escrito por Friedrich Nietzsche indaga pelo estilo em que as pessoas se constituem e se tornam no que são. Mas Nietzsche não é único. Frequentemente seus leitores mais interessantes aparecem: Heidegger, Deleuze, Derrida, Rorty, cada qual com uma aproximação peculiar, criando um caleidoscópio conceitual e criativo, ao menos aos meus olhos. Embora saiba que Caetano Veloso tenha feito uma linha da música Sampa exatamente para mim. As figuras mais presentes são Nietzsche e seu conceito de vivências ao lado de Jacques Derrida com seu conceito de otobiografia, reinventado pelas nossas pesquisas.

Como disse, não sei como se faz um grupo de pesquisa. Nem exatamente como ele acaba. Talvez haja mais a ser dito enquanto dura...